190 da Tomada de Belém – Conheça a revolta de pretos, indígenas e ribeirinhos denominada de Cabanagem

Nesta semana, são celebrados os 190 anos da tomada de Belém, importante marco histórico da Revolução Cabana. As revoltas tiveram início em 1823 e se estenderam até 1840.
Apesar de ser associada à participação popular — em especial, de indígenas, camponeses e ex-escravos — as revoltas também envolveram membros da elite, e têm seus antecedentes marcados pela resistência à Independência do Brasil, em 1822, e pela recusa ao reinado de Dom Pedro I por parte da Província de Belém do Grão-Pará — atuais estados do Pará, Maranhão e Tocantins. Dessas tensões surge a aliança entre o povo e as elites em um dos maiores movimentos vividos pelo povo paraense.
No dia 6 de janeiro de 1835, ocorreu a tomada da cidade de Belém e, no dia seguinte foi instituído o governo cabano, que duraria até 19 de fevereiro.
Para o historiador especializado em estudos culturais e história oral, Jaime Cuellar Velarde, não se deve pensar a Cabanagem como um movimento que emergiu do povo. Ele explica que a Província de Belém do Grão-Pará e Maranhão possuía mais ligações com Portugal, o que explica a não só a adesão tardia à independência, mas o fato de a elite fazer parte do movimento.
“A Cabanagem foi um movimento com múltiplos interesses, envolvendo diversos grupos sociais – desde ex-escravos até donos de seringais, fazendeiros, padres, jornalistas… Então, não se pode dizer que foi um movimento somente de pessoas que viviam às margens dos rios. Haviam outros interesses, principalmente políticos”, explica.
Assim, o movimento é, de certa forma, dual. De um lado, os afroindígenas e, do outro, a elite local, com comerciantes e fazendeiros, além de padres e jornalistas — todos unidos contra o governo regencial de Dom Pedro I. O professor diz ainda que a regência de Dom Pedro I penalizou mais as camadas menos favorecidas da sociedade da época e a elite, que aceitou a independência a muito contragosto, perdeu o espaço que tinha.
“A regência de Dom Pedro é um problema, porque ameaça os interesses políticos portugueses e é porque age com violência, atrocidade e desleixo. Esse desleixo administrativo acaba afetando a população mais pobre. Então, tanto os mais pobres quanto os mais ricos se veem unidos em um interesse comum: derrubar o governo central”, resume.
Dessa união surge a revolta mais marcante da história do Pará, onde cerca de 30 mil homens tombaram. Hoje, a Cabanagem — uma revolta sufocada que não conseguiu alcançar o seu objetivo – ganha uma série de novos significados, mas é sempre lembrada como símbolo de luta e resistência. Segundo o historiador, há também uma tentativa dos políticos em se apropriar da história do movimento. A própria Assembleia Legislativa do Estado do Pará (Alepa) carrega o nome de Palácio da Cabanagem.
Nos governos recentes de Jader Barbalho (MDB-PA), o ideário cabano se transformou em um mote de discurso político. A partir desse momento creio que perde credibilidade a ação política, porque ela se torna muito mais uma plataforma em busca de votos do que efetivamente uma política pública de valorização do social e do popular no Estado do Pará”, afirma.
Em 1840, a Cabanagem foi sufocada e chegou ao fim. Mas ela ainda é motivo de inspiração para muitos, como afirma Moisés, Coordenador Estadual do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra.
“A inspiração da Cabanagem para a gente, do MST, nos faz pensar em uma releitura da sua memória coletiva, de um povo com sua identidade camponesa, diverso. Onde índio, negro, caboclo, deram o seu exemplo que só o povo em luta pode reestabelecer a sua dignidade, sua cultura. Impregnamos uma cultura inteira como valores de solidariedade na qual podemos viver sem ser explorados e sem sermos exploradores de outros seres humanos”, afirma.
Por: Catarina Barbosa (PA) – BdF PA