MST alfabetizou mais de 100 mil adultos com a EJA em todo país
Juntamente com a luta pela democratização na terra e pela implantação da Reforma Agrária no Brasil, assim que iniciou as primeiras ocupações terras na década de 1980, o MST percebeu que aliado a essa luta era essencial também lutar pelo direito ao acesso à educação pública e de qualidade no campo, garantido na Constituição Federal de 1988, para a alfabetização das famílias Sem Terra e dos Sem Terrinha, a formação e profissionalização da sua base social para a continuidade da luta e avanços nas lutas da classe trabalhadora brasileira.
Nesse contexto, há quase 40 anos o MST tem como prioridade a luta pelo direito à educação pública nos territórios onde vivem os trabalhadores (as) Sem Terra do campo. Até o momento o MST já alfabetizou mais de 100 mil adultos pelo Brasil em campanhas de Educação de Jovens e Adultos (EJA), com base no método de alfabetização cubano “Sim, eu Posso”, criado em 1961 e o Círculo de Cultura de Paulo Freire, incorporado a partir de 2016 pelo setor de educação do MST na Jornada de Alfabetização no Maranhão, que se estendeu para áreas urbanas periféricas.
Diante do processo de luta pela educação, o MST também conquistou a construção de cerca de 2 mil escolas públicas em assentamentos e acampamentos da Reforma Agrária, garantindo o acesso à educação para 200 mil crianças, adolescentes, jovens e adultos; além de possibilitar a formação de 2 mil estudantes em cursos técnicos e superiores e técnicos e criar mais de 100 cursos de graduação em parceria com universidades públicas e institutos federais por todo país.
Histórico da Alfabetização
Ao longo do processo de luta pela terra e Reforma Agrária os Sem Terra edificaram o método, de forma paralela às ocupações de terra em processos de EJA, a partir da necessidade de alfabetização e acesso à educação pública aos trabalhadores e trabalhadoras do campo.
A partir da década de 1990, o MST definiu algumas linhas políticas e iniciou o desenvolvimento de ações pedagógicas contra o analfabetismo nos territórios. O marco histórico na EJA foi o lançamento do Projeto de Alfabetização do MST em 1991, no assentamento da antiga fazenda Annoni, em Sarandi, no Rio Grande do Sul, que contou com a presença do educador Paulo Freire na época.
O projeto foi desenvolvido entre 1991 e 1993 em parceria com o Instituto Cultural Francisco de Assis, o Ministério da Educação (MEC), a Cáritas e a Ação de Educação Católica (AEC) e envolveu 100 turmas de alfabetização. A experiência foi a base para construção do projeto político pedagógico do MST na EJA nos acampamentos e assentamentos de Reforma Agrária.
Tiago Manggini, do setor de educação do MST, explica que o Movimento ao longo da sua trajetória de luta organiza diversas campanhas de alfabetização com a intenção de estabelecer unidade nas ações de alfabetização realizadas em vários estados, bem como “lutar por políticas públicas e criar uma mística buscando ampliar o processo de alfabetização e escolarização de jovens e adultos.”
Segundo ele, os Sem Terra buscam desencadear um “processo de alfabetização de todos e todas jovens e adultos dos assentamentos e acampamentos coordenados pelo MST, que não tiveram acesso à leitura e à escrita, contribuindo para que essas áreas se tornem territórios livres do analfabetismo“, resumiu Manggini.
Para Cristina Vargas, do setor de educação do MST, a experiência histórica do MST demonstra que o jeito de fazer a luta por educação é de forma paralela à luta pela terra, desenvolvendo experiências concretas de alfabetização e reflexão acerca da realidade de vida dos trabalhadores e trabalhadoras do campo.
“A luta do MST pela Reforma Agrária acontece ao mesmo tempo em que o Movimento reivindica o acesso ao conhecimento, e ele também se coloca para construir um processo de educação de forma refletida, tendo como base a ação – reflexão – ação. Dessa forma constitui a sua história e suas ações na luta pela Educação do Campo”, pontua Cristina.
Porém, por outro lado, ao longo dos anos várias Escolas do Campo foram fechadas em áreas de assentamento e acampamentos do MST, principalmente nos governos de Temer e Bolsonaro. Um estudo e levantamento realizado pelo Grupo de Estudos e Pesquisa em Educação Rural na Amazônia (GEPERUAZ) e o Censo Escolar do INEP, constatou que 104.385 Escolas do Campo foram fechadas nos últimos 21 anos no Brasil. Somente, em 2021, foram 3.424 Escolas do Campo fechadas, o que se traduz na negação do direito à educação pública pelo governo federal para a população do campo.
Portanto, paralelo à luta pela terra, o MST realiza uma Campanha Nacional permanente contra o fechamento e pela construção de novas Escolas do Campo, e denunciando que “Fechar Escola é Crime!”, alertando a população para o crime que é fechar essas escolas nas comunidades rurais
Enraizamento da EJA
Já nos anos de 1996 e 1997, o MST firma o primeiro convênio de EJA com o MEC, que envolveu 500 turmas de alfabetização e a formação e capacitação de 500 monitores. Parceria fundamental para o enraizamento dos projetos de alfabetização na base Sem Terra do MST em acampamentos e assentamentos. Nesse período também se destacam duas parcerias com governo estaduais; uma com a Secretaria de Educação do Estado do Paraná em 1996, envolvendo 100 turmas de EJA, e um convênio do MST com a Universidade Federal de Sergipe (UFSE), firmado em 1995.
Outros acontecimentos importantes em 1997 também merecem atenção na área da alfabetização: a realização do 1° Encontro Nacional dos Educadores e das Educadoras da Reforma Agrária (ENERA), em que ocorre a socialização das experiências de EJA desenvolvidas em diferentes estados do país; E a criação do Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (PRONERA), resultado de anos de lutas dos movimentos populares do campo, que por meio da parceria com universidades e movimentos sociais possibilitou a alfabetização e escolarização de jovens e adultos, capacitação de educadores, e realização de cursos de graduação e pós-graduação, voltados aos trabalhadores e trabalhadoras, ligados aos movimentos de luta pela Reforma Agrária no país.
Nesse período, também é firmada uma nova parceria entre o MST, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) e o MEC, que visava a criação de 680 turmas de alfabetização envolvendo dez mil educandos.
Segundo Tiago Manggini, nesse sentido o setor de educação do MST percebe a importância da EJA como um instrumento fundamental nas áreas de acampamento e assentamento, para a escolarização no campo e o desenvolvimento político da organização.
“Os Sem Terra não enxergam a EJA só como alfabetização, mas passam a percebê-la como um processo de escolarização, vinculado à formação humana em suas várias dimensões. Tal é a expressão da força que vinha ganhando a EJA neste período. A partir daí é cunhado o lema da alfabetização de jovens e adultos nos assentamentos e acampamentos: ‘Sempre é tempo de aprender’”, relata.
Em 2007 as ações desenvolvidas pelo MST no campo da EJA convergem para a criação da Campanha Nacional de Alfabetização no MST: “Todos e Todas Sem Terra Estudando”, lançada durante o 5º Congresso Nacional do MST, em Brasília, com o objetivo de combater o analfabetismo nos territórios da Reforma Agrária.
A intenção do MST com a campanha é estimular e buscar parcerias para possibilitar que todos e todas as pessoas que vivem nas áreas de acampamentos e assentamentos do Movimento tenham acesso à educação e/ou estejam inseridos de alguma forma em processos educativos.
Entre 2016 e 2018, inspirado nos ensinamentos de Paulo Freire, o MST readapta a experiência dos Círculos de Cultura do pensador para alfabetização de trabalhadores e trabalhadoras de comunidades rurais e urbanas durante a Jornada de Alfabetização no estado do Maranhão, que alfabetizou 21 mil pessoas, trabalhou com dois métodos similares, que se complementam: o método cubano “Sim, eu Posso” e o método brasileiro, dos Círculos de Cultura de Paulo Freire, os dois ancorados em um projeto de sociedade e compromisso de emancipação.
A partir de 2022, por meio do setor de educação, o MST também participa da Jornada de Alfabetização “Sim, Eu Posso!”, que acontece no município de Maricá (RJ), em parceria com a Prefeitura Municipal, com a intenção de zerar o analfabetismo no município.
Campanha Internacional na Zâmbia
Atualmente o MST também desenvolve a Campanha de Alfabetização e Agroecologia Fred M’membe coordenada pelos militantes da Brigada Internacionalista do MST na Zâmbia Samora Machel em parceria com o Partido Socialista (SP) do país. A campanha teve início em maio de 2021 e a meta é alfabetizar 10 mil camponeses e camponesas zambianos/as.
Entre março e abril de 2022 ocorreu a formatura de 100 turmas pelo país, alfabetizando aproximadamente 2 mil camponeses e camponesa na primeira fase, nas Província de Eastern, Lusaka e Western, em 22 municípios, sendo a maioria em comunidades rurais.
A Campanha entrou na segunda fase no ano de 2022, se estendendo para outras três províncias do país, Muchinga, Northern e Copperbelt, com a tarefa de alfabetizar 2.100 educandos ao longo de 2023. O lançamento da segunda fase ocorreu juntamente com a finalização da segunda fase da Campanha de Arrecadação de Bicicletas, construída em parceria com o Comitê de Amigos e Amigas do MST na Espanha, com o objetivo de viabilizar o acesso à escola pelos educadores e educadoras.
A Campanha Bicicletas para Zâmbia foi realizada de forma simultânea à Campanha de Alfabetização, a partir de dezembro de 2020 e se encerrou com um saldo positivo, com a arrecadação de recursos para a compra de 410 bicicletas.
Redação
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